sexta-feira, 5 de maio de 2017

Manifesto Munduruku


Nós, povo Munduruku, que ocupamos as terras indígenas do médio e alto Tapajós, em um total de 13 mil índios, nos municípios de Itaituba, Trairão e Jacareacanga, estado do Pará, estamos reunidos em um grupo de 130 pessoas, numa manifestação pela reivindicação de nossos direitos. Desde o último dia 26, ocupamos o Km 30, no ponto de encontro entre as rodovias BR-230 (Transamazônica) e BR 163 (Santarém-Cuiabá), e bloqueamos o fluxo dessa estrada. Essa foi a única forma que encontramos para chamar atenção do Governo Federal para as nossas demandas, que estão presentes na seguinte pauta de reivindicação:
- Exigimos a demarcação da TI Sawré Muybu: o Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação dessa terra foi publicado em 19 de abril de 2016, porém, até o presente, um anos após esse ato, o processo de demarcação se manteve parado. Exigimos que a FUNAI der continuidade com esse processo e que o Ministério da Justiça emita, enfim, a portaria declaratória da TI Sawré Muybu.
- Não aceitamos a Medida Provisória 756/2016, que cria a APA do Trairão, em área sobreposta à TI Sawré Muybu: exigimos que essa medida seja revogada, uma vez que a mesma cria a APA Trairão sobre a TI Sawre Muybu. Essa unidade de conservação permite a exploração da área por não-índios, fato que é inconstitucional, posto que a TI, já reconhecida pelo Estado, é área de ocupação e usufruto exclusivo do Povo Munduruku.
- Não aceitamos “projetos da morte” em nosso território: somos terminantemente contrários à iniciativa do Governo Federal de construir hidrelétricas na bacia do rio Tapajós. Assim como, não aceitamos as propostas de Concessão Florestal das Florestas Nacionais Itaituba I e Itaituba II, pois este processo tem sido realizado com total desrespeito ao direito originário do Povo Munduruku, assim como aos direitos da população ribeirinha que ocupa há muitas gerações as terras que serão afetadas por esse projeto, no âmbito do qual, até o presente momento, não se realizou a Consulta Livre, Prévia e Informada dos povos tradicionais, tal como o que previsto na Convenção 169 da OIT.
- Exigimos o fortalecimento da CR do Tapajós: as medidas do Governo Federal, tal como o Decreto 9.010/2017, contribuíram substancialmente para o enfraquecimento da FUNAI, que há anos já vem sido nitidamente sucateada. Acreditamos que o enfraquecimento desse órgão tem relação direta com a falta de compromisso do Governo Federal com a promoção dos direitos dos povos indígenas. Estamos cientes, ainda, que os interesses governamentais estão aliadas com políticas de crescimento econômica que são diretamente opostas à agende indígena. Porém, acreditamos que a Funai ainda pode ser um órgão fundamental para a efetivação de nossos direitos, principalmente no que se refere à demarcação de terras indígenas e a proteção de nossos territórios. Diante disso, exigimos que o Ministério da Justiça e a Presidência da Funai resolvam os problemas que assolam a Coordenação Regional do Tapajós, que hoje está praticamente agonizante. Exigimos a nomeação do Coordenador Regional Titular; a nomeação dos demais cargos de chefia que hoje se encontram vagos; a estruturação física, técnica e financeira da CR e das CTLs de Itaituba, Santarém e Jacareacanga; e a convocação, imediata dos novos servidores aprovados no último concurso público, em número suficiente para atender a demanda da CR Tapajós, conforme análise dos servidores dessa unidade, a serem consultados.
Sem mais, esta é a nossa pauta de reivindicação!

Desde o dia 26 de abril (2017) os indígenas ocupam uma ponte da rodovia Transamazônica, considrada como principal via de transporte para o escoamento de grãos vindos do Mato Grosso. A manifestação está a 25 quilômetros dos portos de Miritituba, local de escoamento de grãos e onde operam empresas como Amaggi, Cargill e Bunge. 

terça-feira, 2 de maio de 2017

"Lições das ocupações humanas no passado Amazônico"


Lições das ocupações humanas no passado Amazônico
Por Marc Dourojeanni, em 17 de abril de 2017

"Estudos recém-publicados que brindam mais evidências sobre a presença de civilizações[i] e sobre a domesticação e propagação de árvores[ii] pelas sociedades pré-colombianas na Amazônia têm se prestado para interpretações curiosas, exemplificadas em titulares como “Pesquisa com geoglifos indica que Amazônia teve uso sustentável há milhares de anos[iii] e “O grande pomar dos índios pré-colombianos[iv]. Essas afirmações foram inspiradas aos jornalistas por declarações de alguns dos autores dos estudos apesar de que não eram objeto das pesquisas mencionadas nem figuram nas conclusões dos textos científicos. No essencial, defendem a ideia de que as atividades dos antigos habitantes da Amazônia eram ambientalmente sustentáveis e que as modificações ao ambiente por eles feitas são positivas, bem-vindas."

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leia também nossas postagens anteriores 

Bibliografia:

[i] Watling, J. et al  2016. Impact of pre-Columbian “geoglyph” builders on Amazonian forests. Proceedings of the National Academy of Sciences vol. 114 no. 8: 1868–1873
[ii] Levis et al, 2017  Persistent effects of pre-Columbian plant domestication on Amazonian forest composition  Science 355, 925–93
[v] Lumbreras, L.  1981 Arqueología de la América Andina Ed. Milla Batres, Lima 278p.; Kauffmann, F.  1980 “Los pinchudos”: Exploración de ruinas intactas en la Selva  Boletín de Lima 7; Kauffmann, F.  1986 Sarcófagos pre-incas en los Andes Amazónicos peruanos  Lima, Kuntur 1: 4-9
[vi] Denevan, W. M.  1970  Aboriginal drained fields in the Americas  Science  169:647-654;  Denevan, W. M.  1976  The aboriginal population of Amazonia   In The Native Population of the Americas in 1492  (Ed W. Denevan) pp 205-234; Denevan, W.M.  1992  The Pristine Myth: The Landscape of the Americas in 1492
[vii] Del Busto, J. A.  1980 El descubrimiento del Amazonas  Lima, Studium  39p.
[ix] Brack. A.   1999  Diccionario Enciclopédico de Plantas Útiles del Perú   Lima, UNDP 550p.
[x] Harris, D. R.  1972  The origins of agriculture in the tropics American Scientist  60: 180-193
[xi] Plowman,T.  1984 The origin, evolution and diffusion of coca, Erythroxylon spp In South and Central America  in Precolombian Plan Migration (d. Stone ed.)  Peabody Museum of Archeology and Ethnology 76:125-163
[xii] Diammond, J.  2005  Collapse  Pinguin Books
[xiii]   Comunicación personal del botánico Octavio Velarde (1962) y mencionado por Denevan, W. M. 1971  Campa subsistence in the Gran Pajonal, Eastern Peru The Geographical review LXI(4): 496-518
[xiv] Gómez-Pompa, A.. 1987  On Maya Silviculture  Estudios Mexicanos 3(1): 1-17
[xv] Rico-Gyaym V. and J. García Franco  1991  J. Ethnobiol. The Maya and the vegetation of the Yucatan peninsula. 11(1):135-142.
[xvii] MAAP Synthesis #2: Patterns and Drivers of Deforestation in the Peruvian Amazon (http://maaproject.org/2017/maap-synthesis2/)  ; http://af.reuters.com/article/idAFL8N1G75S2
[xviii] Gomez-Pompa, A. and A. Kauss  1992  Taming the wildernesss myth  Bioscience 42(4)
[xix] Rico-Gyaym V and J. García Franco  1991  J. Ethnobiol. The Maya and the vegetation of the Yucatan peninsula. 11(1):135-142.
[xx] McMichael, C. et al   2017. Ancient human disturbances may be skewing our understanding of Amazonian forests. Florida Institute of Technology Proceedings of the National Academy of Sciences.
[xxi] Villachica, H.  1996  Frutales e Hortalizas Promisorias de la Amazonía  Lima, Tratado Cooperación Amazónica  366p.
[xxii] Olmos, F.  2009 . Populações tradicionais e a biodiversidade.  ((o))eco,  segunda-feira, 02 março 2009.